domingo, 11 de novembro de 2012

Flamenco e tai chi chuan, tudo a ver

O que podem ter a ver a dança flamenca e a arte marcial interna tai chi chuan? Se uma é quente e vibrante, a outra parece fria e lenta. Uma acelera a pulsação, a outra acalma. Razão e emoção. Oriente e ocidente, yin e yang.
Nem tanto. Para começar, o flamenco nem é tão ocidental assim, ou só o é por uma questão geográfica, já que é filho de ciganos, árabes, judeus errantes. Flamenco e tai chi têm características marciais - uma no ritmo, a outra por sua própria origem em lutas chinesas. Ambas são telúricas, enraizadoras - por isso, os movimentos se dão de forma pouco verticalizada. Não se buscam as alturas, mas a base, o chão. Por isso as duas me atraem, e também por seu caráter democratizante, porque não é preciso ser uma sílfide para praticar nenhuma delas.
O equilíbrio é fundamental em ambas (alguém vai me dizer que é fundamental em qualquer expressão corporal, no que estará coberto de razão), bem como a percepção de si, a capacidade de dizer ao seu corpo, aos seus ombros, aos joelhos, como se comportar.
E o resultado é um corpo luminosamente belo. Não belo na acepção mercadológica da palavra, mas porque iluminado pela descoberta de si, de suas potencialidades, de sua inteireza. Integridade, todo o tempo. Belo, portanto, nesse (e com) sentido.
Claro que podemos criar essa consciência corporal em outras atividades. Quando fiz pilates, por exemplo, descobri uma musculatura desconhecida para mim, e ficava fascinada com movimentos que pareciam imperceptíveis terem tamanho efeito no dia seguinte, quando acordava lembrando que aqueles músculos existiam! Mas acho que o fato de o flamenco e o tai chi serem tão indissociáveis de suas respectivas culturas (ou crenças?), não se limitando ao desenvolvimento de uma atividade física, faz toda diferença.
Afinal, não posso simplesmente "decorar" os passos do flamenco - tenho que me investir da postura flamenca, de um certo empoderamento feminino, meio ancestral. Não posso só aprender as formas do tai chi - preciso entender que relação elas têm com minha força interna e com a natureza de que faço, de que fazemos parte. Volta a origens (além dos limites da cultura), olhar para dentro de si, buscar postura e força dentro de si - são alguns dos efeitos que ambas provocam. Como é difícil fazer movimentos lentos! Como é difícil assumir a força! Isso vai além da técnica; é preciso realizar mudanças internas para que o externo tenha algum efeito.
Mesmo quando nem todos as podem ver, elas, as mudanças estão ali, brilhantes, renovadoras, reveladoras.







Meus sapatitos chilenos de flamenco, já ficando surrados, que delícia!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

Arquivo do blog