terça-feira, 31 de julho de 2012

Ouro Preto para sempre


Ouro Preto mora definitavemente no meu coração. A cidade de bruma e mistério pintada por Guignard me conquistou desde a primeira visita, há 16 anos. E me encanta cada vez que volto.
Tudo é muito bem cuidado - das cidades brasileiras que conheço (não são tantas assim), ela me parece a que melhor recebe o turista, a mais bem preparada para isso. Não é uma cidade das mais baratas, mas paga-se pelo charme e pela preservação histórica.
Desde a estrada, com sua paisagem de mares de morros, até a entrada tímida, por uma rua estreita, na cidade, que de repente descortina um horizonte de igrejas e prédios coloniais (parece impossível não ver uma igreja para onde quer que se olhe), essa joia colonial vai revelando mineiramente seus encantos. Ela é de fato muito pitoresca - daí o fascínio dos modernistas por ela na década de 1920 (embora nem mesmo os desenhos de Tarsila possam dar uma pálida ideia do que é ESTAR lá). E a divulgação da cidade pelos artistas modernistas, é preciso dizer, teve grande importância no seu tombamento como Patrimônio da Unesco - por isso também Ouro Preto saiu na frente de outras cidades brasileiras no quesito preservação.
Falar das delícias gastronômicas pode soar redundante, mas como não lembrar que é um paraíso de doces (muitos feitos em outras cidades mineiras, é verdade), das cachaças (observação idem), de tutus, feijões tropeiros, torresmos etc., tudo isso cercado de história?
Melhor ainda é voltar tanto tempo depois e ver que a cidade continua se reinventando, com outros lugares interessantes, como a nova loja da cachaçaria Milagre de Minas (que tem não só uma parede de cachaças incríveis, mas também conservas ótimas, como as mostardas chiquérrimas que Guga me deu), o restaurante Bené da Flauta (boa comida, mas espaço melhor ainda), alguns cafés charmosos (e caros), cervejaria, espaços culturais, lojas e fábricas de chocolates, pousadas com forro de madeira policromada (a caprichosa Laços de Minas, cuja pintura do teto reproduz querubins à moda de Mestre Athaíde). E o que dizer do doce de leite com calda de morango? Eu não conhecia e fiquei em êxtase - comi um pote (pequeno, OK) inteiro na volta (e agora suo na academia pelos "morangos extras").
Também é ótimo revisitar o já conhecido - igrejas (não muitas, para não exaurir namorido - afinal, era uma comemoração de dia dos namorados, e não encontro de pesquisadores do Barroco, certo?), a Casa dos Contos, o café Beijinho Doce (que continua servindo seu bolo de morango, que dessa vez resolvi deixar apenas na minha memória afetiva), restaurantes já conhecidos e aprovados.
Ainda por cima, fomos premiados com a descoberta de uma loja de artesanato - Oro Preto, escrito assim mesmo -, de propriedade de uma física nuclear, montada na antiga casa do pai de Aleijadinho. É a cientista quem mora no andar superior - embaixo fica a loja. E nós conhecemos tudinho, que está muito preservado, guiados por seu assistente. Foi a grande surpresa da viagem.
De resto, tudo lindo, com pessoas simpáticas - não só os comerciantes, mas também os passantes na rua, que nos saudavam com um bom dia sorridente -, um sol lindo, um céu azul inacreditável, temperatura perfeita (calorzinho durante o dia, friozinho à noite). E sabem que até as ladeiras pareciam menos íngremes? 

Mais ou menos em ziguezague: Pousada do Mondego e sua luz algo bruxesca; igrejas para onde quer que se olhe; Cachaçaria Milagre de Minas, com a simpática Cida Zurlo palestrando sobre as cachaças nobres; Bené da Flauta, restaurante com ambiente delicioso e boa comida (o frango em crosta de queijo com risoto é de lá); luxúria açucareira; sacada da Casa dos Contos; aconchego da Laços de Minas; descoberta da casa do pai de Aleijadinho; casal bonito e simpaticíssimo diante da Matriz de Nossa Senhora da Conceição; araucária, até aqui?; fachada de Nossa Senhora do Rosário; barroco is in the air; São Francisco de Assis, a igreja mais bonita de Ouro Preto e a feira diária de pedra-sabão; ao fundo da paisagem colonial, o fálico pico do Itacolomi.  
Fotos de Guga: as 2 primeiras, fachada, interior e prato do Bené da Flauta, minha foto na Casa dos Contos, nossa foto (o casal bonito) e a paisagem com Itacolomi.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Dogues "figura"





On the road



AMO pegar estrada! E como voltou à moda (se é que um dia dela saiu) o estar na estrada, com road movies e programas de TV, resolvi compartilhar algumas fotinhos. Eita Brasil imenso e lindo! Aqui só uma amostragem, com mares de morros, campos de altitude, um céu que Georg Grimm deve ter pintado aos suspiros, intempéries, sinais súbitos de civilização e paisagens de sonho. Ah, e o carrinho Highlander, é claro.
Fotos de Guga: as 3 PB, montanhas de Mauá, estrada de terra com Gerais ao fundo e eu como copilota.

sábado, 28 de julho de 2012

Gourmandise XXII - Boeuf Bourguignon

Como a maioria das pessoas que assistiram a Julie e Julia e têm alguma pretensão culinária, eu também quis fazer o Boeuf Bourguignon, que no filme acaba queimado no forno por distração da protagonista. Diante da ênfase dada ao dito, minhas papilas se assanharam e pensei: este é O PRATO.
Mas prepará-lo foi uma saga: embora tenha encontrado a receita no site do Mixirica (a Tatu traduziu a receita do livro de Julia Child, Mastering the Art of the French Cooking, e acrescentou algumas dicas) logo depois de ter assistido ao filme, encasquetei que precisava de uma panela de cerâmica ou de ferro para fazer o prato, pois ela deve ir ao lume do fogão e ao forno. Não me animei a pagar 400 reais ou mais por uma daquelas lindas panelas esmaltadas francesas e pesquisei outras panelas que resistissem a mais de 200 graus de calor, mas não achei nada efetivo. Além disso,  o preparo do prato demanda tempo – são cerca de 3 horas entre o mise-en-place e o “mise-sur-le-table”. Como estava envolvida em outras coisas – curso de cozinha, de pães, saída do trabalho etc. –, o projeto Boeuf Bourguignon ficou em segundo plano.
Foi então que, nas férias de julho, minha sogra me disse que suas poderosas panelas de inox com fundo triplo também iam ao forno. Corri para a rua Paula Souza atrás delas. E além da minha felicidade em cozinhar em panelas novinhas, deu tudo certo – minhas luvas de silicone nem derreteram, apesar de o metal esquentar muito.
Agora sobre o prato. É realmente delicioso. Dá tanto trabalho quanto (ou mais) uma feijoada caprichada. E aqui vai minha heresia: nossa carne de panela, se acrescida de um vinhozinho e legumes glaceados, ficaria parelha. Pronto, falei. É claro que o cozimento em vinho e caldo de carne, o entra e sai do forno, o toucinho separado do bacon (cada um entra numa parte da receita), as ervas cozidas com a carne, as minicebolas e os cogumelos glaceados, o caldo tirado do próprio cozido que é encorpado e derramado depois sobre o prato dão outros status e sabor ao “feito”. Mas essa é a graça da gastronomia: cada prato inspira dezenas de outros.
Para acompanhar, fiz dois tipos de arroz: o branco tradicional e um com abobrinha e açafrão. Em termos de sabor, é melhor ficar com o branco, pois o prato é bem temperado. Também deve cair bem com batatas (sem gratinar, para não ficar pesado) ou massas simples, mas achei que ficaria over para uma refeição noturna. De entrada, fiz bruschettas ensinadas pela sogra, inspirada na receita do Panelinha: tomate, pepino japonês, manjericão, sal, pimenta do reino e azeite sobre uma camada de torradinhas picadas (no lugar dos croûtons da receita do site). A sobremesa foi a já aprovada mousse de chocolate também do Panelinha, acompanhada de morangos. E voilà: tivemos mais um jantar bonito, gostoso e feliz.



Arranjos para o jantar: nos chawans, a bruschetta com torradinhas e na jarra o molho para servir sobre o cozido. Foto artística de Guga para o Boeuf, com carioquinhas e arroz ao fundo

terça-feira, 24 de julho de 2012

Gourmandise XXI - Accanto

Se eu fosse colocar o Accanto num guia da cidade de São Paulo, acrescentaria aquela mãozinha de OK sinalizando que o lugar é um bom custo-benefício. Pena que o restaurante, quase no encontro da Angélica com a Alameda Barros, seja tão escondido - fica eclipsado pela própria parceira, a distribuidora de vinhos Kylix, pois o restaurante fica nos fundos.
Quais as vantagens do Accanto? Além das ousadias (e não bizarrices) do chef Daniel Abujamra no cardápio italiano (que tem massas bem atraentes, além de risotos e carnes), é possível escolher um vinho da loja e consumi-lo pelo preço pago. Ou seja, se eu pagar 80 reais por uma garrafa de vinho, será por um bom vinho, e não pelo que estiver disponível, como acontece na maioria dos restaurantes. O atendimento é bom, o preço por uma comida boa e bem servida é honesto - cerca de 40 reais por prato.
Pode não se tornar o seu favorito, mas uma visita vale realmente a pena.

domingo, 22 de julho de 2012

Música-tema: "Dancin' Days", Frenéticas



Tributo aos 40: dance até sem saber dançar

Quando eu tinha 6 anos, preparei com minha irmã uma coreografia para a música "Dancin' Days", das Frenéticas, que apresentava nas festinhas de fim de ano na vizinhança. Adorava o convite feito pelas moçoilas glamorosas para a dança, mesmo "sem saber dançar", mesmo sentindo e sofrendo. 
Com o tempo, percebi que a vida é como essa dança. Podemos ficar parados no salão, vendo tudo acontecer, ou participar do baile. Arriscar-se a dançar sem saber pode ser doloroso no início, mas pode tornar-se cada vez mais divertido, e pode-se aprender a dançar e até virar a estrela da sua pista de dança.
Sempre arrisquei meus passinhos na pista. Não cheguei aqui ilesa (haverá alguém que chegue?) - tenho marcas no corpo e mais ainda na alma. Mas sinto ainda um apetite de adolescente pela vida, uma curiosidade enorme pela próxima música. Se curti os 30, quando me descobri mais seletiva, vejo os 40 chegarem com aquele friozinho na barriga de primeiro dia de aula (para mim, que adorava o primeiro dia de aula), de primeiro baile: tudo pode ser. O corpo não me deixa esquecer que podem pesar os 40, mas o espírito continua acreditando que tenho a força de duas mulheres de 20. Com a vantagem de não digerir mais as coisas com pressa, ou nem digerir, e sim sorvendo-as devagar, prazerosamente, ou simplesmente ignorando o que não for prazeroso. Podendo dispensar sorrindo o parceiro de dança que não agradar, não topando qualquer canção só para continuar na pista, deixando a festa mais cedo quando achar que "já deu", caprichando sempre na produção e na performance.
E a diversão está só começando, podem acreditar.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Lindezas e milagres - Morro do Pai Inácio, BA

Quando se pensa em Chapada Diamantina, normalmente vem à cabeça uma sucessão de morros sobre um fundo azul ou terracota (a depender da hora do dia), cercada por vegetação de cerrado, contra o horizonte povoado de nuvens baixas, que tocam os morros. A Chapada é isso também, pois à medida que se avança por seu interior descobrem-se, de repente, outras paisagens - matas, caatingas, cachoeiras, campos gerais, montanhas acarpetadas de pequenas árvores.
Quem acompanha o blog desde o início, deve lembrar que um dos primeiros textos falava sobre a Chapada Diamantina, sobre o godó (prato típico da região) de Lençóis e as sempre-vivas de Mucugê (que continua linda). Mas até então eu não havia subido até o Pai Inácio, cuja lenda se refere a um escravo que, caçado por ter seduzido a filha de seu senhor, pulou do morro de cerca de 250 metros de altura com um guarda-chuva, antecipando Mary Poppins em mais de cem anos.
É ao morro do Pai Inácio, entre Lençóis e Palmeiras, que se deve o tal visual típico de que falei mais acima e que fez inclusive parte da abertura de uma novela da Globo, como gostam de lembrar os guias locais. Então, numa das tréguas que a chuva nos deu, fui finalmente conhecer o morro lendário, que já subi com um pouco mais de destreza do que a demonstrada numa trilhinha de nada em Visconde de Mauá (segundo Guga, eu estava parecendo o Homem-Aranha na descida, de tanto esticar braços e pernas para não cair - e funcionou!).




A tradicional paisagem da Chapada Diamantina pode ser vista do alto do Pai Inácio; cenário lunar incrementa o clima de "mistério" do lugar; sombras e sol compõem a paleta divina; Pai Inácio se derrama sobre a estrada; eu e Guga nas alturas.

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

Arquivo do blog