domingo, 8 de dezembro de 2013

Crescer, o necessário adeus

Hoje li um texto bonito da Revista Bula, no Facebook. Falava de como é necessário dizer adeus a coisas, situações e pessoas para poder crescer. Por isso perdemos o primeiro dente, as meninas menstruam, os meninos ganham barba, nascem os desejos, as doenças vêm e vão - as mudanças vão compondo uma valsa de adeuses para que a gente debute, cresça.
Pensei logo na necessidade de deixar as cascas para trás, e tive de fazer um desenho do pinto abandonando o ovo e se mandando. E me lembrei da mariposa desesperada, não a apaixonada de Guadalupe, mas a que me visitou na janela do hotel em Joanópolis, enquanto eu tomava banho. Ela também deixou uma casca para trás antes de se debater contra o vidro, em busca da luz do banheiro. É, nem sempre somente deixar a casca garante a sabedoria...
Eu suspeito que, ainda por cima, crescer de fato tem a ver com alguma dor. Perder dente dói, menstruar dói, desejar dói, se apaixonar dói. Ir embora, ver partir. Um dia, ouvi o parceiro de então dizer que talvez estivesse na hora de ele crescer - houve uma faísca de alumbramento, mas acho que não a atitude, uma pena. O que quero dizer é que, imagino eu, ao desejo de deixar a casca se siga o romper a casca, deixá-la, mas também a necessária consciência da não perenidade, do luto em si. Se não for assim (ah, as leis da natureza, da vida, que cada vez mais vou aprendendo a respeitar!), vamos seguir acreditando que ainda estamos dentro do ovo, protegidos de toda dor. E sem um quinhão de dor, por contraditório e odioso que pareça, não avançamos. Talvez no dia a dia sim, um amanhecer após outro, mas não no processo de autoconhecimento, não no caminho do que nos faz essencialmente felizes.
Eu tenho percebido mais as trocas de casca nos últimos tempos. Tem hora que sinto a alma pesar mais, até ficar insuportável. E creio que é nesse momento que vou parindo, dando à luz eu mesma, só que diferente a cada vez. Pode ser a alma crescendo, querendo mais espaço, dentro de mim, dentro do mundo. Me dizendo: "aqui não fico mais! e então? vens?".
O que posso dizer? Só me resta seguir com ela.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

Arquivo do blog