domingo, 24 de novembro de 2013

Estrada eu sou ou De mãos abertas

Confesso: meu novo processo de mudança (interna, física, espacial) me deixa com um frio na barriga. Olho já com nostalgia para meu quarto, minha casa, minhas coisas, minhas ruas. São quase 13 anos de histórias aqui. Lembro como tudo já foi - mais non, je ne regrette rien. Porque não lamento (o que não quer dizer que não sofra, que não me arrependa - mas acho que integrei as experiências, boas e más) é que olho para o que poderá/deverá ser, e já consigo me imaginar em outro espaço, tendo de conquistar tudo de novo, o que não quer dizer começar exatamente do zero. Outro bairro, outro trabalho, outra rotina, outro amor rodopiam à minha volta, ainda como imagens, mas por isso mesmo já tão próximos da realização - vejo o novo dobrando a esquina, mas agora espero que também chegue, não saio correndo até ele. Caminho em sua direção, e ele vem até mim. Naturalmente.
Passei a fase do medo de uma vida diferente, do medo da solidão. Redescubro como é boa minha companhia. E agora passo a querer simplesmente o melhor para mim, não mais arremedos, improvisos, "o que tiver". O melhor para mim é... o mais simples. De ótima qualidade, mas sem tantos desvios, tantos adereços. Essencial e colorido. Porque não faço o meu caminho: sou o meu caminho.
E enquanto escrevia este post, vi pelo FB que o filme Eu maior, de Fernando e Paulo Schultz, estava disponível no YouTube. Parei de escrever para assistir. Emocionante! Quantas pessoas admiráveis falando com simplicidade sobre o ser feliz, sobre o que isso significa para cada uma delas. Quantas visões diferentes, portanto. Mas com uma coerência acerca da originalidade individual, do que é demandado em cada momento, de que é preciso saber para qual problema se busca uma resposta, da fluidez da vida e do que vamos nos tornando (pois não mudar, como diz Mário Sérgio Cortella, é tacanhice, não coerência). Gosto da ideia de que mais importante que a dor para engendrar mudanças é a crise. Gosto de aprender que a emoção é rápida como um raio, e que o resto são as memórias. Que é à memória da dor (necessária para viver o luto) que nos apegamos, que é preciso abrir as mãos, deixar ir a dor e todo o resto, para que nelas caiba o mundo.
Cá estou, pois, de mãos abertas.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Antes e depois - em looping



Música-tema: On my own, Nikka Costa


Não sei se Nikka Costa era uma dessas crianças cujo talento foi exploradíssimo pelos parentes, mas essa canção é uma das mais pungentemente interpretadas de todos os tempos.
E quem já não se perguntou, e passa a vida toda perguntando, quem é, se se enquadra? Pois.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Umbigada

Acho uma graça o batuque de umbigada - divertido, sensual, tudo de bom. E haja energia para dar aqueles pulos ao mesmo tempo que o parceiro de dança para, literalmente, dar uma umbigada. Aliás, quando se procura a palavra umbigo no Aulete, o exemplo é uma cena de Jubiabá, de Jorge Amado, que descreve a umbigada: "...os pés batiam no chão, os umbigos batiam nos umbigos (...) estavam todos embriagados, uns de cachaça, outros de música." 
O umbigo simboliza o centro - na Antiguidade, do mundo; hoje, do indivíduo. Nos Cantares de Salomão, parece que o umbigo até substituiu textualmente as partes pudendas femininas na função de cálice de delícias. A palavra omphalo (umbigo em grego) refere-se nada mais, nada menos que ao oráculo de Delfos. Coincidência? Nunca.
Olhar pro próprio umbigo pode soar a egoísmo, individualismo extremo, mas às vezes é o oráculo mais confiável que temos. Debruçar-se sobre si (e isso me faz lembrar da imagem clássica de Narciso, mirando-se no espelho de um lago, o extremo indesejável) é a melhor forma de obter respostas. Nesse momento, não são os outros que têm importância, o que querem, o que vão pensar, mas o que queremos, o que pensamos. Para inclusive sermos melhores também para os outros.
Tenho feito muito mais esse exercício umbilical, especialmente quando me pego não querendo fazer algo que a mim interessa por causa (supostamente) de outrem. Incrível, né? Logo eu, que sou tão independente, despojada e tal. Mas acontece. Por exemplo, querer uma cadeira de trabalho melhor: um desejo-necessidade seguido de culpa (???). A imagem lá de dentro responde: ei, tá louca? É para você, é o que você quer, ou Tal coisa (a cadeira velha) não te interessa mais, é a sua vida (a sua coluna) que importa. Vem lá a resposta-chacoalhão de dentro do meu umbigo, do meu íntimo, do oco do meu mundo.
Aí compro a cadeira nova, e volto a respirar, ufa. Não pelo umbigo - mas essa cicatriz ancestral não me deixa esquecer da relação eterna entre o que há dentro e fora de mim, e que de vez em quando é preciso retornar à completa escuridão para ver mais claro.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Novos percursos, novos recursos

Creio que meu trauma com corridas veio do colégio, quando tínhamos que fazer um percurso na pista de ciclismo à guisa de avaliação bimestral. Talvez antes ainda, da época do ginásio. Sempre corri mal, porque respirava mal, pela boca, e quase morria do coração no final da "prova".
Em tempos bem recentes, me peguei correndo, e curtindo correr. Comecei devagarinho. Percebi que os tênis machucavam o calcanhar. Comprei um par próprio para corredores iniciantes. Agora parece que estou flutuando. E volto cheia de serotonina, dopamina, endorfina. Mais feliz e mais bonita, além de mais saudável, é claro.
O mais legal é que essa mudança de "gosto" parece ilustrar uma mudança de paradigma - de alguns, pelo menos - que tenho experimentado. E isso porque não faço a linha "não conheço, portanto não gosto". Acho que tem mais a ver com me descobrir capaz de fazer determinadas coisas, embora, claro, ninguém seja obrigado a ser capaz de tudo, peloamor. Correr é o ápice do saber respirar pra mim - e conseguir fazê-lo é um grande trunfo. Significa que estou sabendo respirar=sabendo pensar=sabendo sentir=sabendo escolher.
Essa apropriação de capacidades e de escolhas e de fazer o que sempre quis vale também para as atividades criativas, para os projetos de vida todos. Descobri coisas novas que faço bem porque faço com amor (bordar, pintar, dançar, cozinhar) e redescobri coisas que sempre foram importantes, mas tinham ficado de lado (viajar, escrever, me relacionar). E assim eu até me emociono ao olhar para meus tênis novos, como se eles fossem uma espécie de laurel por tantas transformações.

No balanço das horas tudo pode mudar

Provavelmente já tive outros momentos assim, de passar por muita coisa, por sentimentos diferentes e até díspares em um curto espaço de tempo. A vida é desse jeito, acredito que pra maioria das pessoas. Mas acho que nunca passei por tantas coisas com tamanha profundidade, observando mesmo o que cada uma quer dizer, na medida do possível procurando enxergar em meio ao riso e ao choro. O importante é que emoções eu vivi? Taí, o Rei deu uma dentro.
Ri, chorei, neguei, cansei, discuti, apaziguei, deixei pra lá, argumentei, acarinhei, chorei de novo, sofri muito, fiquei cara a cara com o abismo, vivi o luto, larguei mão. Veio uma "louca tempestade", como cantaria Ana Carolina, uma chuva diluviana como a de Guantanamera, para lavar e levar tudo e só deixar vivo o que fosse novo, pois o velho não seria capaz de subir ao topo das árvores. Depois, a calmaria.
E do alto das árvores, com outra perspectiva e à medida que a água vai baixando, tenho voltado a ver aquilo que me é caro, e a pensar por que razão ficou esquecido num canto. Agarrada a uma árvore, uma viagem; enroscado num galho mais à frente, um projeto de livro; flutuando na água, o que entendo por relacionamento. Dali vejo tudo, e quando desço vou catando o que é meu. Apesar da aparência de destroço, para tudo há jeito - e a viagem volta a tomar forma, o projeto de livro deslancha, o desenho do amor é de uma clareza desconcertante. Há pouco, tudo vagava no vórtice de águas furiosas e turvas; agora tudo retoma seu lugar. Todo mundo no fundo sabe, mas essa verdade ficou célebre entre nós com Lulu Santos: tudo muda, o tempo todo.
Mesmo sabendo aonde quero chegar, parece que estou aprendendo a deixar o barco correr de vez em quando, sem ter que empregar força, seguindo no balanço das horas e das águas. Aí sim, Fagner, é bom ser um peixe!

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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