sexta-feira, 29 de setembro de 2017

Coisas chatas x alegrias de padeira

Como a vida não é só bichinhos fofos, pedal, comida boa, nos últimos dias tive uns perrengues. Soube, ao consultar meu extrato de cartão de crédito, que tive o mesmo clonado e usado em compras internacionais - por sorte, pequenas (até porque meu limite é pequeno mesmo). Consegui resolver logo, ligando para o banco, que cancelou as compras e providenciou o estorno na outra fatura. Mas fica aquela sensação de vulnerabilidade, de invasão.
Outra coisa bem chata é que, com a greve dos Correios, não recebi ainda o cartão novo, nem o frequencímetro que comprei há mais de um mês, nem uma compra de cadernos que fiz (e que, na verdade, nem tive resposta se o fornecedor enviará à Livraria Cultura). Claro, acho a greve legítima, mas estou naquela expectativa ansiosa e irritante.
Mas, porém, contudo, todavia, alguma coisa boa tinha que acontecer. Depois do malfadado não show de Gilberto Gil, fomos encontrar Cinho e Tai. E descobri que o pai dela tem uma distribuidora de insumos para padaria, inclusive da farinha de trigo que gosto de usar, Finna. E ela me deu 1 kg de farinha integral de boa qualidade para experimentar, benfazejamente. Acabei fazendo uma cuca de banana - inclusive porque ganhamos bananas do vizinho.
Se não estivermos atentos, deixamos de perceber os pequenos e diversos presentes cotidianos, que fazem frente às eventuais chaturas que também ajudam a compor a existência. Uma espécie de trégua, um respiro necessário.

terça-feira, 26 de setembro de 2017

A importância da concentração

Voltando do pedal com o marido, outro dia, me estabaquei na calçada, tolamente. Fui fazer graça em resposta a um comentário dele e, quando me dei conta, o pneu já tinha raspado na guia e eu voei por cima da bike. Até então eu estivera superconcentrada no meu pedal, na minha respiração, e bastou uma distração pra eu ganhar uma raladura dolorida no cotovelo e rasgar minha jersey de mandacarus.
Hoje já não tenho dúvidas de que estar concentrada, inteira, presente no que faço é o melhor estado, que traz os melhores resultados. Pro trabalho, pra cozinha, pro pedal, pra arte, pra vida. Quantas comidas de bola, queimaduras na porta do forno, tombos, pontos malfeitos, más escolhas seriam evitados?
Claro que nem sempre é possível estar 100% ali, por ter alguma preocupação, por estar esgotada ou de saco cheio. Aí, talvez, o melhor seja fazer outra coisa, nem que seja por 10 minutos. E tentar voltar à concentração. Respirar, zerar os pensamentos e concentrar-se. Experimentar a plenitude do momento, experimentar estar integralmente em contato consigo mesma. É muito, muito bom.

Gostaria de ter escrito: Arqueologias culinárias da Índia

Ou qualquer coisa nessa linha. Que delícia ler sobre comida, em um livro escrito por alguém que não só tem prazer na degustação como também no entendimento do que há por trás dos hábitos alimentares.

domingo, 24 de setembro de 2017

O famoso gato por lebre - show de Gilberto Gil sem Gil

Tá, viramos ratos da Concha Acústica - vimos shows ótimos lá: Tom Zé, Zé Ramalho, Novos Baianos, Milton, O Grande Encontro. E achamos que não poderia ser diferente com o amado Gilberto Gil. Mas foi.
As informações sobre o show de comemoração de 40 anos do álbum Refavela, tanto no site do Teatro Castro Alves quanto em sites locais de cultura, como o IBahia e do jornal Correio, falavam que Gil receberia outros artistas, como Céu, para cantar as canções inspiradas em sua viagem à Nigéria. Porém, foi uma espécie de karaokê de familiares de Gil e Caetano, com tentativas explícitas de lançar artistas desconhecidos, como a nora de Gil, casada com o produtor do espetáculo, Bem. O anfitrião do show, na verdade, era Moreno Veloso. Gente, quando é que eu pagaria 120 reais e venceria 60 km de estrada para assistir Moreno Veloso saltitando para lá e para cá? Para ouvir o tímido vocal da nora de Gil? Para só ver Céu 1h20min depois de iniciado o show - quando, na verdade, já estávamos indo embora, por fim convencidos da trapaça toda?
O show começou com um áudio da voz de Gil, gravado nos anos 70, falando do lançamento do álbum. Foi o único sinal de sua presença, ainda que em todos os cartazes sua foto e seu nome apareçam em primeiro plano, inclusive na frente do TCA (grande responsável pela venda do engodo). Pelo que vi no site do Correio de hoje, "quase no final da festa, Gilberto Gil entrou no palco, colocando toda a Concha para dançar ao som do batuque da Patuscada de Gandhy". É realmente possível que aquelas 5 mil pessoas tenham achado normal ir a um show de Gilberto Gil com "participação especial de Gil", quando o que se vendeu foi sua atuação como anfitrião? A minha impressão é de que a maioria do público presente (porque, sim, mais gente foi embora) tenha achado mais cômodo esperar, que tenha se conformado com uma participação, mesmo que mínima, do artista.
Em uma entrevista do Correio, cuja chamada é de que Gil seria o anfitrião, somente no meio do texto dá-se a entender que ele vai cantar 3 músicas durante o show (se tivesse lido isto há 3 semanas, nem perderia tempo). De resto, parece haver um grande conluio midiático para promover o show e os parentes menos famosos do cantor. Tristes tempos estes, em que a cultura também é manchada pelo oportunismo, pelo favorecimento de iguais, em detrimento da maioria da população.

Atualização no dia 25 de setembro:
Teatro Castro Alves: Prezada Solange, lamentamos pelo seu descontentamento. O show de fato se configurava como um tributo, e não como apresentação de Gilberto Gil. O release publicado no site do TCA, disposto pela produção do evento, fazia esta contextualização. Ademais, esclarecemos que a realização do show e do projeto é independente, não se tratou de um espetáculo promovido pelo TCA. Ficamos à disposição para quaisquer esclarecimentos.
Solange Lemos: Teatro Castro Alves, ninguém lamenta mais do que eu, que tenho ido a tantos shows na Concha Acústica, e observado problemas aqui e ali, como a superlotação do espaço e os gritos do público na direção de quem está de pé. Lamento muito que a sanha do lucro produza massas apinhadas nos acessos às arquibancadas da Concha Acústica, que não haja nenhum cuidado da produção com a segurança e o bem-estar do público. Lamento a comunicação dúbia apresentada/compactuada no site do TCA e em outros meios digitais e no cartaz enorme diante do teatro no caso do evento referido. Lamento sobretudo por saber de antemão que esta seria a resposta óbvia à minha reclamação - "não temos nada a ver com isso" porque "o evento é independente", embora eu tenha comprado do TCA, e não da produtora de Bem Gil, os ingressos, o que configura responsabilidade solidária. Lamento, lamento muito mesmo que esse grande complexo tenha se tornado tão pouco convidativo, tão pouco "cultural".

domingo, 17 de setembro de 2017

Comemorando com etruscos e ingleses

Comentei aqui outro dia que estava querendo fazer um prato "etrusco" e uma banoffee pie. Calhou que eu e o marido tínhamos o aniversário de namoro a festejar - eu já não comemorava mais em setembro, porque há o dia dos namorados e também porque resolvemos morar juntos em outra data, além de as comemorações anteriores terem sido meio zicadas. Mas, como foi ele quem se lembrou da data, achei digno retomar a data setembrina. E assim entraram em cena o maiale al latte etrusco/romano e a banoffee pie inglesa.
Os preparativos começaram na véspera, porque quis marinar a carne de porco (usei filé mignon suíno em vez de lombo), embora a Samin Nosrat, professora de culinária do Michael Pollan, não indique isso, mas apenas temperar com sal e pimenta um pouco antes. Eu vi umas dicas num outro site de alguém que já fez o prato e resolvi juntar as duas receitas. Então marinei com vinagre de vinho (porque não tinha vinho), sálvia, alecrim, alho, sal, pimenta-do-reino e limão, para no outro dia selar a carne em azeite bem quente e então adicionar mais alho, sálvia fresca, sal, raspas de casca de limão e 1 litro de leite, incorporado aos poucos, ao longo de quase 3 horas de cozimento. 
Quanto à torta, segui a receita da Dani Noce. O creme de confeiteiro de doce de leite não ficou tão firme, embora gostoso. A dica do creme de leite em lata sem soro e bem gelado para fazer chantilly não funcionou; também não consegui usar meu sifão. Lá fui eu em busca de um preparado para chantilly, da Fleischmann mesmo. Ainda assim, ficou bem gostoso e bonitão. 
O maiale al latte fica com um aspecto talhado, uma espécie de vômito de bebê como bem descreve o Pollan. Mas é uma delícia, ainda mais acompanhado de legumes ao forno.
Foi um jantar preparado lentamente, com paciência, respeito e total atenção, ingredientes também para um relacionamento de longa data como o nosso.

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Baguetes au levain e incentivo em grupo

Depois do curso de panificação em São Paulo, tenho estado em contato com os colegas pelo whatsapp. Tem sido muito bom ver as criações paníferas de Norte a Sul do país. Acabamos nos incentivando uns aos outros, o que é maravilhoso. Vejo as criações de Rafa, Guerra, Raul, Júlio, Gisele, Cleide e Janete e quero fazer também. Eu, ainda com meu forninho doméstico, vou junto. E eles também torcem, uma preciosidade nestes tempos esquisitos de desamor e intolerância.
Enquanto não compro meu forno profissional, faço baguetes au levain. Mas acho que não precisava ter demorado tanto para chegar a esse resultado, embora tenham ficado ótimas - claro que valeu também como desculpa para refrescar o fermento (que logo vai completar 3 anos!).

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

De tédio, aqui não se morre

Não posso reclamar de tédio na minha vida. Nunca. Posso sufocar por fazer somente a mesma coisa, querer sair por aí, espanar a mesmice - mas não posso falar que a vida em si é tediosa, pois ela tem momentos tão diversos, coisas acontecendo ao redor da mesmice, que seria injustiça classificá-la assim.
Ontem, matei meu primeiro (pequeno) escorpião, no banheiro de casa. Depois interrompi com Raid e raiva a cópula de duas baratonas. Hoje soube que meu pão bonitão de damasco e nozes embatumou - e lá fui eu fortalecer o levain, até porque já faz algumas vezes que os pães de levain não têm saído bonitos e gostosos.
Hoje também fui ao primeiro encontro como voluntária no projeto de jovens local. Isso já foi um sopro benfazejo sobre a rotina: não sei viver sem cebolas, mas também não sei viver sem compartilhar o conhecimento.
Outro dia pensei em por que temos assistido a tantos filmes e séries sanguinolentos - a vida imitando a arte e vice-versa - e concluí que queria um pouco de beleza na minha vida. Aí fico sabendo que haverá uma oficina do Matizes Dumont em Salvador. Claro, estarei lá, em busca de beleza e histórias.
Em meio aos horrores de notícias de catástrofes naturais, corrupção e violência (catástrofes sociais), oriento um amigo na feitura de seus pães, pelo bate-papo virtual.
Eu bem gostaria de pegar um cinema de vez em quando, de viajar mesmo que para perto, mas devo admitir que tem sido interessante olhar com mais atenção para a vida cotidiana, que agrega a cada dia pequenas mudanças na tessitura que dela faço.

domingo, 10 de setembro de 2017

Pães e ideias lariquentas de final de semana

Tenho me programado para fazer pães no final de semana, no mínimo. Como temos um aniversário a comparecer amanhã, resolvi fazer pães para a reuniãozinha. Os escolhidos foram o de damasco e nozes de levain e o rústico de ervas da Heloísa Bacellar, sucesso. Já usando uma grade apropriada para o resfriamento.
Claro que, nesse meio tempo, no intervalo de uma ou outra fermentação ou modelagem, relendo o livro do Pollan, vi uma receita de porco cozido no leite, e depois achei a própria, publicada pela professora de culinária do autor: chama-se maiale al latte, talvez uma receita etrusca. Quero fazer, pra ontem. Também querendo fazer banofee pie. Pra anteontem. Isso pra não falar nas ideias de cardápio semanal, à base de curry, batata-doce, funghi secchi.
O problema da cozinha é apenas esse: querer fazer cada vez mais. E eu que reduza as porções e aumente os giros no pedal, pois emagrecer está cada vez menos fácil.

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Encomenda valendo

Recebi outra encomenda de pães. Mas agora eu estava emocional e tecnicamente mais preparada - houve tempo para comprar ingredientes, planejar o mise-en-place e tal.
Porém, como eram pães delícia, o tempo de preparo foi grande. Fiquei o dia todo por conta disso, e estava tão concentrada que nem senti fome - só quando os pães saíram do forno com aquele cheirinho irresistível.
Como eles ficaram supermacios, preferi entregá-los sem empilhar, para não correr o risco de amassados. E tinha até cartõezinhos prontos para deixar minha marca, com gosto de sol.

Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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