domingo, 24 de setembro de 2017

O famoso gato por lebre - show de Gilberto Gil sem Gil

Tá, viramos ratos da Concha Acústica - vimos shows ótimos lá: Tom Zé, Zé Ramalho, Novos Baianos, Milton, O Grande Encontro. E achamos que não poderia ser diferente com o amado Gilberto Gil. Mas foi.
As informações sobre o show de comemoração de 40 anos do álbum Refavela, tanto no site do Teatro Castro Alves quanto em sites locais de cultura, como o IBahia e do jornal Correio, falavam que Gil receberia outros artistas, como Céu, para cantar as canções inspiradas em sua viagem à Nigéria. Porém, foi uma espécie de karaokê de familiares de Gil e Caetano, com tentativas explícitas de lançar artistas desconhecidos, como a nora de Gil, casada com o produtor do espetáculo, Bem. O anfitrião do show, na verdade, era Moreno Veloso. Gente, quando é que eu pagaria 120 reais e venceria 60 km de estrada para assistir Moreno Veloso saltitando para lá e para cá? Para ouvir o tímido vocal da nora de Gil? Para só ver Céu 1h20min depois de iniciado o show - quando, na verdade, já estávamos indo embora, por fim convencidos da trapaça toda?
O show começou com um áudio da voz de Gil, gravado nos anos 70, falando do lançamento do álbum. Foi o único sinal de sua presença, ainda que em todos os cartazes sua foto e seu nome apareçam em primeiro plano, inclusive na frente do TCA (grande responsável pela venda do engodo). Pelo que vi no site do Correio de hoje, "quase no final da festa, Gilberto Gil entrou no palco, colocando toda a Concha para dançar ao som do batuque da Patuscada de Gandhy". É realmente possível que aquelas 5 mil pessoas tenham achado normal ir a um show de Gilberto Gil com "participação especial de Gil", quando o que se vendeu foi sua atuação como anfitrião? A minha impressão é de que a maioria do público presente (porque, sim, mais gente foi embora) tenha achado mais cômodo esperar, que tenha se conformado com uma participação, mesmo que mínima, do artista.
Em uma entrevista do Correio, cuja chamada é de que Gil seria o anfitrião, somente no meio do texto dá-se a entender que ele vai cantar 3 músicas durante o show (se tivesse lido isto há 3 semanas, nem perderia tempo). De resto, parece haver um grande conluio midiático para promover o show e os parentes menos famosos do cantor. Tristes tempos estes, em que a cultura também é manchada pelo oportunismo, pelo favorecimento de iguais, em detrimento da maioria da população.

Atualização no dia 25 de setembro:
Teatro Castro Alves: Prezada Solange, lamentamos pelo seu descontentamento. O show de fato se configurava como um tributo, e não como apresentação de Gilberto Gil. O release publicado no site do TCA, disposto pela produção do evento, fazia esta contextualização. Ademais, esclarecemos que a realização do show e do projeto é independente, não se tratou de um espetáculo promovido pelo TCA. Ficamos à disposição para quaisquer esclarecimentos.
Solange Lemos: Teatro Castro Alves, ninguém lamenta mais do que eu, que tenho ido a tantos shows na Concha Acústica, e observado problemas aqui e ali, como a superlotação do espaço e os gritos do público na direção de quem está de pé. Lamento muito que a sanha do lucro produza massas apinhadas nos acessos às arquibancadas da Concha Acústica, que não haja nenhum cuidado da produção com a segurança e o bem-estar do público. Lamento a comunicação dúbia apresentada/compactuada no site do TCA e em outros meios digitais e no cartaz enorme diante do teatro no caso do evento referido. Lamento sobretudo por saber de antemão que esta seria a resposta óbvia à minha reclamação - "não temos nada a ver com isso" porque "o evento é independente", embora eu tenha comprado do TCA, e não da produtora de Bem Gil, os ingressos, o que configura responsabilidade solidária. Lamento, lamento muito mesmo que esse grande complexo tenha se tornado tão pouco convidativo, tão pouco "cultural".

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Cabeceira

  • "Arte moderna", de Giulio Carlo Argan
  • "Geografia da fome", de Josué de Castro
  • "A metamorfose", de Franz Kafka
  • "Cem anos de solidão", de Gabriel García Márquez
  • "Orfeu extático na metrópole", de Nicolau Sevcenko
  • "Fica comigo esta noite", de Inês Pedrosa
  • "Felicidade clandestina", de Clarice Lispector
  • "O estrangeiro", de Albert Camus
  • "Campo geral", de João Guimarães Rosa
  • "Por quem os sinos dobram", de Ernest Hemingway
  • "Sagarana", de João Guimarães Rosa
  • "A paixão segundo G.H.", de Clarice Lispector
  • "A outra volta do parafuso", de Henry James
  • "O processo", de Franz Kafka
  • "Esperando Godot", de Samuel Beckett
  • "A sagração da primavera", de Alejo Carpentier
  • "Amphytrion", de Ignácio Padilla

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